“o ser humano é só carne e osso e uma tremenda vontade de complicar as coisas.”
A princípio, o livro conta a história de Antonio Jorge da Silva, um senhor de 84 anos que perde sua esposa, a Laura. Ele, ainda muito apaixonado, fica completamente desolado e sem chão com a situação. E que, vou te falar, dói demais no coração.
Antonio tem dois filhos, um deles considera morto e deserdado por não ter se dado ao trabalho de viajar da Grécia para o enterro da mãe. Já a outra filha, ele odeia por tê-lo colocado em um asilo. Asilo esse que se chama “Feliz Idade“, irônico? Talvez.
“talvez devesse lembrá-los de que não sou um homem religioso
e que a perda não me fez acreditar em fantasias.”
O pai se sente traído pela filha e transfere todo esse ódio para o asilo e todas as pessoas que ali moram. Fato é que ele precisa lidar com diversos novos sentimentos, junto com toda a amargura e angústia causada pela morte de sua esposa. Um turbilhão de emoções na cabeça de Antonio no sentido de ter que se readaptar a essa nova vida.
Antonio – que sempre esteve muito ligado ao seu âmbito familiar, reservado e tudo mais – agora se vê diante de muitas outras pessoas e precisa aprender a lidar com outros internos do asilo o que não não é nada fácil, porém extremamente transformador.
Novas pessoas, novas amizades, novos lugares, novas sensações.
Vivendo essa nova rotina no asilo, Antonio terá grandes momentos de autoanálise a partir de uma série de exames de consciência, se assim posso chamar, reflexões sobre sua vida, sobre o seu passado e sobre a maneira como viveu até agora. Ele vai lidar com memórias e alguns arrependimentos, e esse processo é bastante doloroso.
O modo como Antonio fala sobre as pessoas e sobre si mesmo é muito comovente. Há uma grande delicadeza no texto de Vater Hugo Mãe; delicadeza tocante e poética.
“depois confessei-lhe, precisava deste resto de solidão
para aprender sobre este resto de companhia.”
Há também momentos de humor de Antonio junto com os outros idosos. Diálogos engraçados que proporcionam momentos emocionantes em vários sentidos. Choros e risos caminhando lado a lado.
Muitos acham que “com certa idade” não há mais nada de novo para ver ou viver, engano. As experiências se moldam de acordo com as situações, comovem e transformam tanto (se não mais!) quanto as experiências que temos em outras épocas da vida.
Um detalhe que agrega ainda mais valor a obra: Esteves sem metafísica – do poema Tabacaria, de Fernando Pessoa – é um personagem nessa história.
A Máquina de Fazer Espanhóis fala sobre morte, perda, luto, ódio e arrependimento, mas também fala sobre amor, perdão, velhice, poesia, metafísica, política, literatura e redenção. Grande e bela obra!
“mas não posso voltar pra casa sem ela. não a posso deixar aqui sozinha.
não estaria sozinha.
estaria sozinha de mim, que é a solidão que me interessa e a de que tenho medo.
e isso nunca aconteceu.”
Título: A máquina de fazer espanhóis
Autor: Valter Hugo Mãe
Editora: Biblioteca Azul
Número de páginas: 264
Gênero: Romance português
*Livro cedido em parceria com a Globo Livros
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