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02out

Ainda não me acostumei com essa intimidade transformada em diplomacia. Essa polidez. Essa educação. É como se eu nunca tivesse sentido um suspiro longo e profundo seu ao pé do meu ouvido.
Oi, como está?
Logo nós, que completávamos a fala um do outro, agora, não passamos da mera trivialidade.
E em casa, tudo bem?
Me sinto desconfortável. Chega a ser sufocante te conhecer tão bem.
Trabalhando muito?
A página foi virada para ambos, não há outra chance, não há outro meio.
Ouvi que vem uma frente fria na sexta.
A falta de espontaneidade pesa cruelmente em cada frase.
E aí, tem falado com Fulano?
Já bastamos um para o outro por horas, talvez até por dias.
“Risos” Ele sempre some mesmo.
Seu cheiro, que por vezes impregnou em meu suor, agora é só uma lembrança distante.
Você está diferente.
O verbo dói, mas o sujeito não sofre. Não mais.
Acho que você emagreceu, hein.
Você que já soube a medida exata de cada pedaço, cada parte, cada leve curva do meu corpo.
Você ainda tem meu número?
Perdemos o jeito com o nosso abraço. Não sei qual intensidade usar. Perdemos nossa alquimia.
Então tá, a gente vai se falando por aí.
O desconforto por já termos sido íntimos demais. Agora não sabemos como terminar uma conversa. Duelamos nosso adeus.
Tchau, se cuida.
E então, caminhamos em sentidos contrários.
Mais fácil assim.
Sem passos para nos prender.
Sem sentimentos para nos manter.
Sem mãos para nos tocar.
Sem olhares para nos dilacerar.
Seguimos.
Com dois nós na garganta.
Como dois estranhos.
Enfim.

Adriana Cecchi


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